JOPHRA MORIER
Permitam que eu os conduza a um tempo antes da memória dos homens, ao sopé de montanhas cobertas por névoas espessas, onde as palavras ainda não haviam sido domesticadas. Era uma época que os calendários futuros chamariam de 16.000 a.C., e eu, então um jovem homem de Neandertal de olhos inquietos, buscava mais do que abrigo — buscava sentido.
Foi nas cavernas de uma floresta úmida, ao norte da antiga Frígia, que recebi o convite silencioso de um velho ancião de pele curtida e voz de pedra. Ao redor de uma fogueira crepitante, entre cânticos guturais, fui conduzido a um rito ancestral, onde cogumelos Psilocybe Cubensis — oferecidos como oferenda viva da Terra — dissolveram a realidade diante de meus olhos.
Naquela noite, deixei de ser apenas carne. Compreendi minha existência.
Meu corpo estremeceu, meus ossos cantaram uma canção que não vinha de mim, e tudo que era tempo se dobrou sobre si mesmo. Vi minha infância e minha morte se olharem nos olhos. Vi o início e o fim colidirem dentro de mim como estrelas antigas. E no centro disso tudo, havia um portal — não para outro lugar, mas para outro estado de ser.
Ao retornar, nada em mim era como antes. A pele era a mesma, mas o tempo já não a tocava. A sede era a mesma, mas não por água — por conhecimento e compreensão.
Não sou imortal — sou testemunha. E testemunhar, é uma forma de eternidade. Por isso escuto, observo, absorvo, escrevo e conto. Porque em cada palavra há um fragmento daquilo que vi — e daquilo que ainda não ousamos lembrar.
Jophra Morier